Resposta:
"As Humanidades e as Ciências Sociais passam a contar agora com mais um texto de referência: o presente livro sobre o pagode baiano. Ari Lima burilou minuciosamente uma parte da sua tese de doutorado, que eu tive o prazer de orientar, de tal modo que o texto aparece renovado e atual, em suas várias facetas – como peça etnográfica, como síntese histórica e também como ensaio interpretativo, em uma linha essencialmente crítica e engajada. Escrito originalmente dentro do quadro disciplinar da Antropologia, este livro consegue concretizar uma proposta da Antropologia como Crítica Cultural, paradigma surgido
a partir do livro homônimo de George Marcus e Michael Fischer, que tanta influência causou nos anos 80 e 90, mas que poucas vezes foi de fato levado à prática (etnográfica ou teórica) na nossa comunidade acadêmica. O foco na música popular afro-brasileira orienta o campo disciplinar da obra primeiramente para a abordagem etnomusicológica: daí a minha sugestão de que Ari Lima acaba de produzir um dos primeiros ensaios, em nosso país, que possa ser apontado como cofundante do campo da Etnomusicologia, entendida não apenas como uma disciplina autônoma, mas como mais uma instância de Crítica Cultural.
Tal sugestão faz sentido se ajustarmos a sua obra à grade estabelecida das disciplinas acadêmicas. Contudo, fazendo a devida justiça ao caráter aberto do Programa da UNEB ao qual está vinculado, seu texto é fundamentalmente interdisciplinar (quando não diretamente transdisciplinar, termo que melhor definiria a postura intelectual crítica, tal como no caso presente). Em um texto denso, altamente sintético e preciso, Ari Lima atravessa e incorpora as abordagens de inúmeras disciplinas – Antropologia, Sociologia, História, Etnomusi" cologia, Comunicação, Teoria Literária, Teoria do Gênero e da Sexualidade.
Essa vocação interdisciplinar já foi prefigurada na sua formação acadêmica, que combinou Comunicação com Antropologia.
Empenhados que estamos – vários de nós que debruçamos com os temas da Crítica Cultural – em gerar no Brasil um campo de Estudos Culturais sensível às nossas singularidades, podemos identificar no seu livro sobre o pagode baiano o tipo de articulação teórica (para utilizar um conceito caro a Stuart Hall, um dos autores inspiradores do seu trabalho) e a multidimensionalidade de planos etnográficos que são a promessa principal dos Estudos Culturais. Tal como tento formulá-lo neste momento, ao fundamentar esta área interdisciplinar na Universidade de Brasília, os Estudos Culturais somente se justificam como uma real inovação epistemológica e teórica se forem concebidos como Estudos Críticos da Cultura...